quarta-feira, 2 de julho de 2008

A EDUCAÇÃO MEDIEVAL E RENASCENTISTA

Por ocasião da invasão dos bárbaros, a cultura greco-romana esteve a ponto de ser destruída, o que só não aconteceu graças, em grande parte, à atuação da Igreja Cristã, pois somente através da religião foi possível educar os novos povos.
A educação dos povos europeus na Idade Média, portanto, teve como ponto de partida a doutrina da Igreja. Assim, a instrução nessa doutrina e a prática do culto substituíram o elemento intelectual. Todos os tipos de educação que se desenvolveram durante o longo período da Idade Média não passaram de modalidades diferentes de preparação para um estado futuro.
Sob o domínio da Igreja, este estado futuro tornou-se a “outra vida”. Durante todo este período predominou uma concepção de educação que se opunha ao conceito liberal e individualista dos gregos e ao conceito de educação prática e social dos romanos.

1. O cristianismo e o novo ideal educacional
Enquanto os filósofos gregos davam mais importância ao aspecto intelectual do homem, o cristianismo, pelo contrário, passou a dar maior importância ao aspecto moral. O cristianismo não se baseia no ideal de imediata felicidade nem no de vida da razão; baseia-se, primordialmente, na idéia de caridade cristã ou amor, que é a expressão mais individual e completa da personalidade humana.
O novo ideal educacional, portanto, concentra-se no aspecto moral da pessoa humana. Esse novo ideal educativo do cristianismo é um renascer para um mundo novo do espírito.
Com o cristianismo surge um novo tipo histórico de educação com normas inéditas de vida e comportamento. No Sermão da Montanha, Jesus Cristo instaura uma nova visão do mundo e da vida, que contrasta ostensivamente com as culturas precedentes, fundadas num ideal heróico, aristotélico e terreno da existência. “Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus”. “Bem-aventurados os pacificadores porque serão chamados filhos de Deus.”

2. Os primeiros padres da Igreja, o cristianismo e a filosofia pagã
Os primeiros padres da Igreja, diante das diferenças entre o cristianismo e o saber grego e romano, ocupam posições diferentes.
Clemente de Alexandria (150 – 215), por exemplo, sustentava que os evangelhos eram o platonismo aperfeiçoado e que “Platão era o Moisés helenizado”. Ensinou que a filosofia pagã era um “pedagogo para conduzir o mundo a Cristo”. São Justino (100 – 165) e Orígenes (185 – 254) pensavam da mesma forma.
Mais tarde, porém, surgem alguns padres que passam a se opor ao saber pagão e especialmente à filosofia grega. São João Crisóstonomo (340 – 407), referindo-se a tal saber, escreve “Abandonei há muito tempo tais tolices, pois não podemos despender toda a vida em brinquedos de crianças”. E São Basílio (329 – 379), escrevendo sobre a educação de crianças, resume assim sua posição: “Temos então de abandonar a literatura? Direis. Não digo isso: mas que não devemos matar as almas... Na verdade, a escolha jaz entre duas alternativas: a educação liberal que podeis conseguir enviando vossas crianças às escolas públicas ou a salvação das suas almas que podeis assegurar enviando-as aos monges. Quem deverá vencer, a ciência ou a alma? Se puderdes unir ambas as vantagens, fazei-o por todos os meios; mas se não o puderdes, escolhei a mais preciosa.”
São Jerônimo (347 – 420), autor da versão da Bíblia para o latim, combateu, no campo educacional, a disciplina excessiva no ensino de sua época. Enfatizou também a importância de se respeitar a personalidade do aluno e de ser criar, na escola, um ambiente de amizade.
Santo Agostinho (354 – 430), o mais ativo e mais brilhante dos padres da Igreja, consagrou sua extensa cultura ao combate às heresias. Embora inicialmente admirasse o saber clássico, com o passar do tempo essa admiração foi diminuindo.
Santo Agostinho escreveu uma importante obra pedagógica, De magistro, na qual fala do processo de ensino dentro de uma visão platônica. Diz que o órgão de todo aprendizado é o logos ou mestre interior (auto-educação), que atua por iluminação divina, servindo-se das palavras e sinais como meios de comunicação. A teoria da iluminação, porém, não se ajusta com a idéia platônica de reminiscência, pois, para o cristianismo, a alma não preexiste ao corpo.

3. As escolas cristãs primitivas
A Igreja Cristã primitiva, em sua tarefa de reforma moral do mundo, volta sua atenção para a educação moral de seus próprios membros.
Os que se convertiam á religião cristã passavam por um período inicial de preparação, durante o qual recebiam instrução na doutrina cristã. Os recém-convertidos, antes de serem admitidos como membros efetivos da Igreja, eram chamados de catecúmenos, e as escolas onde recebiam instrução, de catecumenatos.
Com o tempo, tais escolas passaram a ser organizadas pelos bispos com o intuito de preparar o clero para as igrejas que estavam sob sua direção. Passaram, então, a ser denominadas escolas das catedrais, por estarem localizadas no edifício da catedral.

4. O monaquismo
Monaquismo significa a organização de homens que fizeram votos especiais de vida religiosa e vivem de acordo com regras que determinam a conduta nos seus menores detalhes.
O estudo nos mosteiros ocupava um papel preponderante. São Bento (480 – 547), fundador da ordem dos beneditinos, determinou que cada religioso deveria ter sete horas por dia de trabalho, que poderia ser manual ou literário. Determinou, também, que cada religioso deveria dedicar de duas a cinco horas de leitura por dia.
São Basílio estipulou regras semelhantes. Desse regime de trabalho imposto aos monges surgiram diversos benefícios para a educação. Os principais foram:
- surgimento das escolas para preparação dos jovens aceitos para a vida monástica.
- cópia e conservação dos livros.
- o estudo da literatura.
- formação de um ambiente favorável ao estudo e à reflexão.
Os mosteiros eram praticamente as únicas instituições de ensino da época. Eram os únicos centros de pesquisa, as únicas casas editoras para a multiplicação dos livros, as únicas bibliotecas para a conservação do saber, enfim, os mosteiros preparavam os únicos sábios e estudiosos da época.
Um dos trabalhos mais significativos dos monges no campo educacional foi, sem dúvida, a cópia dos manuscritos. Sem esse trabalho a maior parte das obras do passado não teriam chegado até nós.
Deve-se aos monges, também, a condensação do saber da época nas Sete Artes Liberais, que incluíam o trivium (Gramática, Dialética, Retórica) e o quadrivium (Aritmética, Geometria, Música e Astronomia). O trivium e o quadrivium unidos constituíam o septivium.
5. A escolástica

O termo escolástica significou inicialmente o conjunto do saber, tal como era transmitido nas escolas do tipo clerical. O escolástico era o mestre das Sete Artes Liberais ou o chefe das escolas monásticas ou catedrais. Mais tarde se deu o mesmo nome aos que escolarmente se dedicavam à Filosofia e à teologia.
Num sentido amplo, porém, podemos dizer que a escolástica é um movimento intelectual oriundo da Idade Média, preocupado em demonstrar e ensinar as concordâncias da razão com a fé pelo método da análise lógica.
A escolástica, portanto, não se caracteriza por nenhum conjunto de princípios ou crenças, mas por um método ou tipo peculiar de atividade intelectual. Seu objetivo era apoiar a fé na razão, procurando acabar com todas as dúvidas e controvérsias através da argumentação.
Dessa maneira, a educação escolástica visava desenvolver o poder de formular as crenças num sistema lógico. A forma científica valorizada era a lógica dedutiva. Por isso, a escolástica é definida, freqüentemente, como a união das crenças cristãs com a lógica aristotélica.
A escolástica compreende três períodos:
· o de formação (desde o século IX até fins do século XII);
· o de apogeu (1220 a 1347), época de fundação dos grandes sistemas escolásticos;
· o de decadência 9até últimos anos do século XV), caracterizado pela reprodução das doutrinas da fase precedente.

Os principais representantes da escolástica são:
· Santo Anselmo (1033 – 1109) o primeiro a fazer distinção entre saber e crença.
· Santo Alberto Magno (1200 – 1280) denominado o Doutro Universal, foi o primeiro a reproduzir a filosofia de Aristóteles em forma sistemática.
·
Santo Tomás de Aquino
[1] (1225 – 1274) o Doutor Angélico foi o mais influente de todos. Sua monumental obra, a Suma Teológica, representa a culminância da escolástica. Com relação ao ensino, ele insiste na participação que o educando deve ter em sua formação física e espiritual. Santo Tomás admite, como Santo Agostinho, que Deus é o verdadeiro mestre que ensina dentro de nossa alma, porém sublima a necessidade de uma ajuda exterior. Deus nos infunde no entendimento os princípios fundamentais; contudo, as aplicações desses princípios, as deduções que deles se originam, são obra humana e da experiência. No educando o saber está contido só potencialmente; o mestre o ajuda, leva-o a atualizá-lo, não no sentido de que se opere sobre sua alma como causa final, isto é, como modelo que o discípulo tende a realizar.
· Duns Scotus
[2] (1266 – 1308) o Doutor Sutil, celebrizou-se como fundador de uma escola de teologia rival da de Santo Tomás de Aquino.
· Guilherme de Occam
[3] (1300 – 1350) o Doutor Invencível, negava que as doutrinas teológicas pudessem ser demonstradas pela razão e sustentava que era totalmente matéria de fé.
6. As universidades
São as seguintes as principais circunstâncias que determinam o surgimento e desenvolvimento das universidades européias no século XIII;
- o desenvolvimento interno das escolas monásticas e escolas catedrais.
- o vigoroso influxo da ciência e da Teologia.
- o desenvolvimento do comércio e o crescimento das cidades, que estimularam o interesse pelo ensino.
- o movimento das Cruzadas, que tirou a sociedade européia do seu isolamento.
O primeiro nome dado às novas instituições de ensino foi o de studium generale. Isto, no entanto, não significa que tais instituições em seu início, incluíssem todos os ramos do saber; significa apenas que era um instituto geral (não local) para todos os estudantes preparados, sem distinção de raça e nacionalidade. Em sua origem, um studium generale podia cultivar e ensinar apenas um ramo do saber; podia, por exemplo, ensinar só Direito.
Só mais tarde, pelos fins do século XIV, o nome studium generale foi substituído pelo de universitas. Isto ocorre quando um studium generale chega a organizar-se em forma de cooperação de mestres e alunos, pouco importando que, a princípio, seus membros se consagrassem a uma só disciplina. À semelhança da expressão studium generale, a palavra universidade adquiriu o sentido de instituição docente e de investigação, dedicada, com liberdade de mestres e alunos, a todos os ramos do saber (universitas litterarum).
Talvez a primeira universidade que congregou professores e alunos organizados por seções nas quatro grandes divisões do conhecimento daquela época (Teologia, Direito, Medicina e Filosofia) tenha sido a de Nápoles, fundada em 1224.
Podemos citar, entre as universidades mais importantes, as de Paris, Bolonha, Salermo, Oxford, Viena e Salamanca.
Durante a Idade Média foi muito grande a influência da universidade. Ela forneceu o primeiro exemplo de organização puramente democrático. Foi uma das grandes forças da Idade Média, a única que à época representava a cultura superior do espírito, quando não havia outros corpos científicos, nem imprensa, nem jornais, nem revistas. Representava também a opinião pública, não somente nos assuntos científicos, mas também nos grandes problemas políticos e eclesiásticos, ou por não existirem corporações políticas regulares, ou por estas se reunirem de quando em quando.

7. Tendências gerais do Renascimento
Renascimento significa, etimologicamente, a ação de renascer, isto é, nascer de novo. Tradicionalmente, no entanto, a palavra renascimento designa o movimento cultural e artístico que se desenvolveu nos séculos XVI e XVII. Esse movimento, que teve início na Itália e daí se estendeu para o resto da Europa, propunha-se restaurar as formas e ideais da Antiguidade clássica.
Segundo Paul Monroe, as atividades do Renascimento podem ser resumidas em três tendências gerais, que representam três grandes interesses quase desconhecidos durante a Idade Média:

1º) Interesse pela vida real do passado. Os gregos e romanos tinham um conhecimento mais amplo da vida e das suas possibilidades do que a humanidade da Idade Média. As idades clássicas expressaram esse conhecimento através de uma literatura e uma arte incomparavelmente superiores às da Idade Média, que no entanto as ignorava.

2º) Interesse pelo mundo subjetivo das emoções - da alegria de viver, dos prazeres e satisfações contemplativas desta vida e da apreciação do belo. O pensamento medieval ignorava completamente este mundo.

3º) Interesse pelo mundo da natureza física. Este não só era desconhecido dos povos medievais, como, seu estudo era considerado baixo e humilhante.

8. Conseqüências dos novos interesses

As principais conseqüências dos novos interesses foram:
· estudo mais amplo e intensivo das línguas grega e latina;
· caça aos manuscritos remanescentes desta literatura;
· restauração das obras clássicas;
· criação, na literatura, de um novo interesse por tudo o que apelasse para a imaginação e para o coração;
· o esforço artístico, sob todas as suas formas, passa a predominar como em nenhum outro período da História;
· a análise introspectiva da vida emocional provoca imensa produção literária (poesia, drama e romance);
· desenvolvimento das ciências históricas e sociais;
· deslocamento do centro de gravitação, até então situado nas coisas divinas, para o próprio homem.

9. Conseqüências educacionais

Uma das principais conseqüências educacionais do Renascimento, ao lado da exaltação do estudo dos clássicos, é a bus promova o ideal da nova vida.
E qual é esse ideal?
Quem responde é Paulo Vergério (1349-1420), professor da Universidade de Pádua, que em 1374 escreveu um tratado sobre educação: "Para um temperamento vulgar, o lucro e o prazer são os alvos da vida; para uma natureza elevada, a dignidade moral e a glória são tudo".
O conteúdo da nova educação, que consiste principalmente nas línguas e nas literaturas clássicas dos gregos e romanos, passa a ser designado, durante este período, pelo termo humanidades.Batista Guarino, em seu tratado sobre a educação (1459), escreve o seguinte: "O conhecimento e a prática da virtude são peculiares_ ao homem; eis por que os nossos antepassados chamavam Humanitas aos propósitos, às atividades específicas da humanidade. Nenhum ramo do conhecimento abrange uma extensão tão ampla de assuntos quanto esta ciência que tento descrever".
O interesse da educação no Renascimento está centrado, portanto, "nos propósitos, nas atividades específicas da humanidade", e a literatura dos gregos e romanos era apenas um meio para a compreensão de tais atividades. Por isso, o aprendizado da língua e da literatura dos gregos e romanos torna-se o problema pedagógico mais importante.

10. Alguns representantes do Renascimento

A Itália foi o berço do Renascimento. Mais do que qualquer outro povo, a língua e a literatura a uniam com a época clássica. Dante Alighieri foi o mais antigo dos precursores do Renascimento. Com a Divina comédia ele deu a seu país uma língua nacional. Petrarca (1304-1374) e Boccaccio (1313-1375) ressuscitaram o interesse pelo estudo dos clássicos latinos e gregos.
No campo educacional, porém, o maior inovador foi Victorino da Feltre (1378-1446). Sua maior criação foi uma escola à qual deu o nome de Casa Giocosa (casa alegre), para diferenciá-la das escolas de tipo medieval, de disciplina rígida e austera.
A Casa Giocosa preocupava-se, acima de tudo, com a formação integral do homem. Procurava educar harmonicamente os jovens através da educação física, equitação, salto, corrida, esgrima e guerra simulada; no plano de ensino, colocava no centro as "artes liberais"; e ensinava aos jovens literatura e história de Roma, em vez de meras fórmulas lingüísticas.
Victorino da Feltre costumava dizer: "Quero ensinar os jovens a pensar, não a delirar". Afirmava, também, que o ensino deveria ser gradual e de acordo com o desenvolvimento psíquico do aluno, e transcorrer num ambiente de alegria e satisfação.
Com relação ao nome Casa Giocosa, convém lembrar que a palavra italiana giocosa deriva do vocábulo latino iocus, sinônimo de ludus, que, como vimos, foi o nome dado à escola elementar romana. "Vinde, ó meninos, aqui se instrui, não se atormenta", dizia uma legenda da Casa Giocosa.
A experiência pedagógica de Victorino da Feltre foi a primeira tentativa, na Itália, de criar uma escola à margem das organizações religiosas. E os seus resultados, certamente, foram muito bons, pois dela saíram humanistas, chefes de Estado, eclesiásticos, filósofos, educadores, juristas, homens de ciência, poetas.
Na França, dois representantes do Renascimento se ocuparam com problemas da educação: François Rabelais (1483-1555) e Michel de Montaigne (1533-1592). Rabelais voltou-se contra a educação formalista e livresca, e apresenta suas idéias sobre educação através de uma novela pedagógica cheia de ironia, chamada Gargântua e Pantagruel. "Gargântua, filho do gigante Grangollete e da giganta Gargabela, mostrava desde menino felizes disposições para o estudo. Seu pai, monarca poderoso, confia-o a dois mestres, nos quais Rabelais personifica a educação oca e sofística da época.
Gargântua trabalha durante vinte anos com todas as suas forças, aprende muitos livros e até os pode recitar de memória; mas não progride, e o rei gigante nota que seu filho está se tornando tolo e idiota. O rei se queixa de tão triste resultado a um amigo seu, e este lhe diz que há outro meio de educar a juventude, e apresenta ao rei um pequeno pajem, chamado Exudermo, muito esperto, e que forma lastimável contraste com Gargântua. Então o gigante faz chamar o preceptor Exudermo, a fim de que se encarregue da educação de seu filho.
O novo preceptor de Gargântua começa por levá-lo a viajar para ilustrá-lo, e lhe distribui as horas do dia a fim de que o discípulo não desperdice nenhuma. Ensina-lhe por meio do jogo, ensina-lhe no momento de tomar refeição, ensina-lhe Botânica nas flores do campo e nas ervas. Astronomia, nos astros. Higiene, nos alimentos e assim por diante; sempre sob a forma sensível, intuitiva. Ao mesmo tempo enrijece seu corpo, obriga-o a saltar, a subir em árvores, a
nadar, a disparar a funda e a flecha, esgrima, equitação, ginástica completa. Ensina-lhe a moral fugindo do fanatismo e da despreocupação, afeição à leitura e ao desenho, e até os jogos de cartas e fichas lhe servem para o ensino de Geometria e Aritmética." Rabelais condensa seu pensamento no seguinte princípio: "Ciência sem consciência não é senão ruína da alma".
O outro representante francês do Renascimento que se ocupou com os problemas da educação foi Montaigne. Para Montaigne, a educação de seu tempo era livresca, cheia de pedantismo, desligada da vida e propensa a punir as crianças com castigos corporais. Diz ele: "Os eruditos exclamam com freqüência: Cícero falava assim, estas foram as palavras de Platão, estas são as próprias palavras de Aristóteles. Um papagaio podia dizer o mesmo! Mas, o que é que dizemos e que seja nosso? Que é que podemos fazer? Que juízo temos? Tal instrução é como moeda falsa, que não tem outro valor senão o de uma ficha para cortar ou sustentar naipes. Porque o conhecimento que vem dos livros merece o maior desprezo se nada tem a ver com a vida real do indivíduo.
O que abusa de enriquecer-se com o acúmulo de tantos conhecimentos, nunca será esperto nem brilhante. O ideal educativo de Montaigne é o homem para o mundo. Por isso a educação deve formar o homem completo, de corpo e alma. É preciso educar o juízo do aluno, em vez de encher-lhe a cabeça com palavras. Para tanto, o professor, ao invés de dizer tudo ao aluno, deve mostrar-lhe as coisas, torná-las agradáveis para que ele aprenda a discernir e a escolher por si mesmo. Algumas vezes o professor deverá abrir-lhe o caminho; outras vezes procurará que a criança se esforce por abri-lo. O professor não deve ser o único a falar. Deve, também, ouvir seus alunos.
Montaigne dá outros conselhos ao professor. Diz, por exemplo, que o professor não deve limitar-se a indagar o aluno apenas sobre as palavras da lição; deve indagá-lo, principalmente, sobre o sentido e a substância, "julgando o proveito que tirou, não pelo testemunho da vida".
Logo a seguir, aconselha: "Procure também que o seu discípulo aprenda, se possível, aplique a cem usos, para ver se o aplica bem e se o compreendeu. É indício certo de que o estômago não desempenhou bem as funções quando devolve os alimentos no mesmo estado em que os recebe. As abelhas voam de flor em flor roubando-lhes parte dos delicados sucos que contêm, que não são o próprio mel; este as abelhas formam depois e é inteiramente seu. Da mesma forma devem os discípulos recolher idéias e conhecimentos dos demais, não para reproduzi-los como os recebem, mas para transformá-los e fundi-los em obra própria. Guarde em boa hora o que recebeu emprestado, mas revele ao mesmo tempo o que fez por sua parte".
Com relação ao programa de estudos, Montaigne recomenda o conhecimento da natureza, da língua materna, da História que "é um espelho onde é preciso olhar para conhecer-nos bem". Com relação aos métodos de ensino ele reprova os educadores que consideram seus alunos como sujeitos passivos aos quais se tenha que transmitir os conhecimentos como "idéias já feitas".
Recomenda que se procure estimular a atividade espontânea dos meninos e jovens (métodos ativos), mediante a observação direta da natureza e do juízo autônomo da razão: "Faça-se a criança adquirir curiosidade por todas as coisas, que veja quanto haja de singular a seu redor: um edifício, uma fonte, um homem, o lugar de uma antiga batalha, uma passagem de César ou de Carlos Magno".
As idéias de Montaigne tiveram repercussões benéficas sobre a educação.
Sua preocupação com um tipo de educação destinada a formar o juízo prático dos jovens para as coisas da vida coincide com as preocupações educativas de nosso tempo.


Questões para reflexão:
1. Até que ponto as concepções e ideais surgidos na Idade Média influíram e influem na educação e cultura brasileira?
2. Que preocupações do Renascimento coincidem com as preocupações educacionais de nosso tempo?

[1] Cf. http://www.aquinate.net/p-web/Portal-Tomas/Vida/portal-tomas-vida-ensino.htm
[2] Cf. http://www.aquinate.net/p-web/Portal-Tomismo/Antitomistas/antitomistas-duns-escoto.htm
[3] Cf http://pt.wikipedia.org/wiki/William_de_Occam

4 comentários:

Emanuela Souza. disse...

Ótima postagem, e logo quando eu estava precisando de uma luz para entender o que foi a Educação Medieval. Parabéns!
:*

Unknown disse...

quiboooooooooooooooooooom

Evandro Fernandes disse...

GOSTEI DO LEVATAMENTO.

Unknown disse...

Bem explicadinho .Robson