sexta-feira, 20 de junho de 2008

A EDUCAÇÃO GRECO-ROMANA

1. O pensamento educacional da Grécia

Se a principal característica da educação oriental foi tentar reproduzir e conservar o passado mediante a supressão da individualidade, o sentido particular da educação grega reside no fato de que aí, pela primeira vez, deu-se oportunidade ao desenvolvimento individual. A conseqüência não foi somente o progresso, mas também o desejo desse progresso e a luta por ele.
O progresso social floresceu em virtude da liberdade da organização da sociedade grega que estimulava o desenvolvimento de todos os aspectos da personalidade e tinha em apreço as formas de expressão do valor individual. Como resultado dessas características, os gregos formularam, pela primeira vez, aquele conceito de educação que nós ainda denominamos liberal. É a educação digna do homem livre, que o habilita a tirar proveito de sua liberdade ou dela fazer uso. Mais do que com qualquer outro povo do passado, foi com os gregos que o problema da educação surgiu com as características mais semelhantes das que adquiriu para nós.
O termo pedagogia é de origem grega e deriva da palavra paidagogos, nome dado aos escravos que conduziam as crianças à escola. Somente com o tempo, esse termo passa a ser utilizado para designar as reflexões feitas em torno da educação. Assim, a Grécia clássica pode ser considerada o berço da pedagogia, até porque é justamente na Grécia que tem início as primeiras reflexões acerca da ação pedagógica, reflexões que vão influenciar por séculos a educação e a cultura ocidental.
Os povos orientais acreditavam que a origem da educação era divina. O conhecimento que circulava na comunidade resumia-se aos seus próprios costumes e crenças. Essa realidade impedia uma reflexão sobre a educação, uma vez que esta era rígida e estática, fruto de uma organização social teocrática. A divindade, portanto, era autoridade máxima, logo, sua vontade não poderia ser contestada.
Na Grécia Clássica, pelo contrário, a razão autônoma se sobrepõe às explicações puramente religiosas e místicas. A inteligência crítica, o homem livre para pensar e formar os juízos a cerca da sua realidade, preparado não para submeter-se ao destino, mas para influenciar e ser agente de transformação como cidadão, eis no que resume-se a revolucionária concepção grega da educação e seus fins.
Dentro dessa nova mentalidade, surgem várias questões cuja reflexão visa enriquecer os fins da educação. Como por exemplo:
- O que é melhor ensinar ?
- Como é melhor ensinar ?
Essas questões enriquecem as reflexões de vários filósofos e dão origem à dimensões tendenciosas.
Para entendermos melhor é necessário fazermos a divisão clássica da filosofia grega, não esquecendo que o eixo central é Sócrates.

2. A educação espartana
A Grécia achava-se dividida em Cidades-Estado, das quais as mais conhecidas são as antagônicas Esparta e Atenas. Esparta ocupava o fértil vale do rio Eurotas, na região da Lacônia, ao sudeste da península do Peloponeso. Por volta do século IX, o legislador Licurgo organiza o Estado e a educação. Licurgo percebeu a importância do Estado nos assuntos educacionais. Os espartanos, que representavam a mais primitiva forma de cultura grega, conquistaram, já no período homérico, uma posição de destaque entre os demais povos helênicos. De início os costumes não são tão rudes, e a formação militar é entremeada com a esportiva e a musical. Com o tempo e, sobretudo no século IV a.C. quando Esparta derrota Atenas - o rigor da educação se assemelha à vida de caserna.
O objetivo da educação espartana era dar a cada indivíduo um nível de perfeição física, coragem e hábito de obediência às leis que o tornasse um soldado ideal. Dessa maneira o homem espartano passou a ser um modelo de bravura, vigor e tenacidade. Como essas qualidades faltavam aos demais povos gregos, o Estado espartano passou a acumular um grande número de triunfos militares.
Plutarco resume a educação espartana com as seguintes palavras: “Em relação à instrução eles recebiam apenas exatamente o que era absolutamente necessário. Todo restante de sua educação tinha em vista torná-los sujeitos ao comando, suportar os trabalhos, lutar e conquistar.”
Até os sete anos de idade o menino ficava sob os cuidados diretos de sua mãe, de quem recebia um treino rigoroso. Depois era tirado do lar e colocado em casernas públicas custeadas pelo Estado. Nessas casernas os meninos comiam em mesas comuns, ajudavam no fornecimento do alimento necessário, caçavam os animais selvagens e participavam de danças corais. Todo o resto do seu tempo era gasto com exercícios de ginástica, que constituíam o elemento principal de sua educação.
Dos dezoito aos vinte anos o jovem dedicava-se ao estudo das armas e das manobras militares. Dos vinte aos trinta anos seu treino era na guerra ou, nos intervalos de paz, praticado às custas dos ilotas (servos que moravam em choupanas). Em Esparta, nove mil espartanos tinham que dominar vinte mil ilotas.
Com trinta anos o jovem tornava-se maior de idade e continuava a dedicar seu tempo integralmente a serviço do Estado, seja nas guerras ou nos treinamentos necessários.

3. A educação ateniense
Atenas passou pelas mesmas fases de desenvolvimento de Esparta; mas enquanto Esparta se deteve na fase guerreira e autoritária, Atenas priorizava a formação intelectual sem deixar de lado a educação física que não se reduzia apenas a uma simples destreza corporal mas que vinha acompanhada por uma preocupação moral e estética.
Na primeira parte de sua cultura aparecem formas simples de escolas e a educação deixa de ficar restrita à família e a partir dos 7 anos começava a educação propriamente dita, que compreendia a educação física, a música e a alfabetização. O pedotriba era o responsável em orientar a educação física na palestra onde os exercícios físicos eram praticados.
Além da educação física, a educação musical era extremamente valorizada não se limitando apenas à música mas também a poesia, canto e a dança. Os locais que eram praticados eram geralmente as palestras ou, então, em lugares especiais. O ensino elementar como a leitura e a escrita durante muito tempo não teve a sua devida atenção como teve as práticas esportivas e musicais tanto que os mestres eram geralmente pessoas humildes e mal pagas e não tinham tanto prestigio quanto o instrutor físico.
Com o passar do tempo foi se exigindo uma melhor formação intelectual delineando-se três níveis de educação: elementar, secundária e superior. O didáscalo era o responsável em ensinar a leitura e a escrita em locais não definidos e com métodos que dificultam a aprendizagem e por volta dos 13 anos completava-se a educação elementar.
Aqueles que tinham maiores condições de continuar os seus estudos entravam para a educação secundária ou ginásio onde, inicialmente, eram praticados os exercícios físicos e musicais, mas com o tempo deu-se lugar as discussões literárias abrindo espaço para o estudo de assuntos gerais como a matemática, geometria e astronomia principalmente a partir das influências dos professores. O termo secundário chegou mais próximo do seu conceito atual quando foram criadas as bibliotecas e salas de estudos.
Dos 16 aos 18 anos, a educação superior só se dá com os sofistas, que mediante retribuições elevadas se encarregavam de preparar a juventude para a oratória. Sócrates, Platão e Aristóteles também ministravam a educação superior.
Neste contexto não havia uma preocupação com o ensino profissional, pois estes eram aprendidos no próprio mundo do trabalho com exceção da medicina que era uma profissão altamente valorizada entre os gregos e que tomavam como parte integrante da cultura grega.


4. O período pré-socrático
O período pré-socrático inicia-se por volta do século VI a.C., quando aparecem os primeiros filósofos das colônias gregas da Jônia e na Magna Grécia. Podemos dividi-los em várias escolas:
Escola Jônica: fazem parte os seguintes filósofos: Tales, Anaximandro, Anaxímenes, Heráclito, Empídoeles;
Escola Itálica: Pitágoras;
Escola Eleática: Xenófones, Parmênides, Zenão;
Escola Atomista: Gencipo e Demócrito.
Esse período caracteriza-se como uma nova forma de analisar e ver a realidade. Antes esta era analisada e entendida, apenas do ponto de vista mítico, agora é proposto o uso da razão, o que não significa dizer que a filosofia vem para romper radicalmente com o mito, mas sim para suscitar o uso da razão no esclarecimento, sobretudo da origem do mundo.
Os antigos relatos míticos da origem, inicialmente transmitidos oralmente e depois transformados em poemas por Homero e Hesíodo, são questionados pelos pré-socráticos, cujo objetivo principal é explicar a origem do mundo a partir do "arché" ou seja, o elemento originário e constitutivo de todas as coisas.
Nessa busca de desvendar racionalmente a origem, cada um surge com uma explicação diferente, como por exemplo:
- Tales: a origem é a água;
- Anaxímenes: a origem é o ar;
- Anaximandro: a origem está no movimento eterno que resulta na separação dos contrários (quente e frio, seco e úmido, etc.)
- Heráclito: tudo muda, tudo flui. A origem reside num constante ‘devir".
- Parmênides: A origem está na essência: o que é, é e não pode ser ao mesmo tempo.
Outra diferença que podemos notar entre a filosofia nascente e as concepções míticas é que esta era estática, ou seja, não admitia reflexões ou discordância. A filosofia nascente por sua vez, deixa o espaço livre para reflexão, daí cada filósofo surgir com uma explicação diferente para o "arché", ou seja, a origem.
Apesar dessas diferenças, vale ressaltar que não há uma ruptura radical com o pensamento mítico, permanecendo este, presente em algumas explicações desses filósofos frente às divindades, uma vez que este não aceita a interferência dessas nas explicações. Assim, a "phisys" (natureza)é dessacralizada e todas as afirmações passam a exigir fatos que justifiquem as idéias expostas.
Toda essa mudança de pensamento é de fundamental importância para o enriquecimento das reflexões pedagógicas em busca de uma educação ideal que faça do homem grego senhor de si mesmo, combatendo assim, as velhas idéias de submissão às explicações puramente mitológicas.


5. O período clássico
Atenas havia se tornado o centro da vida social, política e cultural da Grécia, em virtude do crescimento das cidades, do comércio, do artesanato e das artes militares. Atenas viva seu momento de maior florescimento da democracia. A democracia grega possuía duas características de grande importância para o futuro da filosofia. Em primeiro lugar, a democracia afirmava a igualdade de todos os homens adultos perante as leis e o direito de todos de participar diretamente do governo da cidade, da polis. Em segundo lugar, e como conseqüência, a democracia, sendo direta e não por eleição de representantes no governo, garantia a todos a participação no governo e os que dele participavam tinham direito de exprimir, discutir e defender em público suas opiniões sobre as decisões que a cidade deveria tomar. Surgia assim, a figura do cidadão.
Contudo, é bom lembrarmos que as opiniões, não eram simplesmente jogadas às assembléias e aceitas por elas, era necessário que o cidadão além de opinar, falar, deveria também buscar persuadir a assembléia, daí o surgimento de profundas mudanças na educação grega, pois antes da democracia as famílias aristocratas eram donas não só da terra como também do poder. A educação possuía um padrão criado por essas famílias que era baseado nos dois poetas gregos Homero e Hesíodo que afirmava que o homem ideal era o guerreiro belo e bom.
Entretanto, com a chegada da democracia, o poder sai das mãos da aristocracia e, esse ideal educativo vai sendo substituído por outro. O ideal de educação do Século de Péricles é a formação do cidadão.
O cidadão somente se faz cidadão a partir do momento em que exerce seus direitos de opinar, discutir, deliberar e votar nas assembléias. Dessa forma, o novo ideal de educação é a formação do bom orador, ou seja, aquele que saiba falar em público e persuadir os outros na política.
Para suprir a necessidade de dar esse tipo de educação aos jovens em substituição a educação antiga, surgem os sofistas que foram os primeiros filósofos do Período Clássico. Em síntese, os sofistas surgem por razões políticas e filosóficas, entretanto, mais por funções políticas.
Os sofistas foram filósofos que surgiram de várias partes do mundo e não tinham portanto, uma origem bem definida. "Sofista significa (...) "sábio" - "professor de sabedoria". (...)[Em] um sentido pejorativo, passa a significar "homem que emprega sofismas", ou seja, homem que usa de raciocínio capcioso, de má-fé com intenção de enganar.
Os sofistas contribuíram bastante para a sistematização da educação. Eles se julgavam sábios, possuidores da sabedoria e como Atenas passava por uma fase de crescimento cultural e econômico e paralelo a isto, o surgimento da democracia, os sofistas ensinavam principalmente a retórica, que é a arte da persuasão, instrumento principal para o cidadão que vivia a democracia. Contudo, é bom ressaltar que não ensinavam de graça, mas cobravam, e bem, por seus ensinamentos. Isso teve grande contribuição na profissionalização da educação.
Entretanto, por cobrarem e se julgarem sábios e possuidores da sabedoria, foram bastante criticados por Sócrates e seus seguidores, haja vista que para Sócrates o verdadeiro sábio é aquele que reconhece sua própria ignorância. Para combater os sofistas, Sócrates desenvolve dois métodos que são bastantes conhecidos até os dias de hoje: a ironia e a maiêutica. O primeiro consiste em conduzir, através de questionamentos, o ouvinte que até o momento está convencido de que domina completamente determinado conteúdo, de que este não sabe realmente tudo. A partir do momento em que este se convence disto, Sócrates passa a utilizar o segundo método que é a maiêutica, que significa dar luz às idéias. Nesse momento o ouvinte consciente de que não sabe tudo busca saber mais buscando respostas por si próprio.

6. Sócrates: o mestre que desafiou o homem a se conhecer

O pensamento do filósofo grego Sócrates (469-399 a.C.) marca uma reviravolta na história humana. Até então, a filosofia procurava explicar o mundo baseada na observação das forças da natureza. Com Sócrates, o ser humano voltou-se para si mesmo. Como diria mais tarde o pensador romano Cícero, coube ao grego “trazer a filosofia do céu para a terra” e concentrá-la no homem e sua alma, a psique. A preocupação de Sócrates era levar as pessoas, por meio do autoconhecimento, à sabedoria e à prática do bem.
Nessa empreitada de colocar a filosofia a serviço da formação do homem, Sócrates não estava sozinho. Pensadores sofistas, os educadores profissionais da época, igualmente se voltavam para o homem, mas com um objetivo mais imediato: formar as elites dirigentes. Isso significava transmitir aos jovens um saber enciclopédico e desenvolver sua eloqüência, que era a principal habilidade esperada de um político.
Sócrates concebia o homem como um composto de dois princípios, alma (ou espírito) e corpo. De seu pensamento surgiram duas vertentes da filosofia que, em linhas gerais, podem ser consideradas como as grandes tendências do pensamento ocidental. Uma é a idealista, que partiu de Platão (427-347 a.C.), seguidor de Sócrates. Ao distinguir o mundo concreto do mundo das idéias, deu a estas status de realidade; e a outra é a realista, partindo de Aristóteles (384-332 a.C.), discípulo de Platão que submeteu as idéias, às quais se chega pelo espírito, ao mundo real.
Nas palavras atribuídas a Sócrates por Platão na obra Apologia de Sócrates, o filósofo ateniense considerava sua missão “andar por aí (ruas, praças e ginásios, as escolas atenienses de atletismo), persuadindo novos e velhos a não se preocuparem tanto, nem em primeiro lugar, com o corpo ou com a fortuna, mas antes com a perfeição da alma”.
Defensor do diálogo como método de educação, Sócrates considerava muito importante o contato direto com os interlocutores – o que é uma das possíveis razões para o fato de não ter deixado nenhum texto escrito. Suas idéias foram recolhidas principalmente por Platão, que as sistematizou, e por outros filósofos que conviveram com ele. Sócrates se fazia acompanhar freqüentemente por jovens, alguns pertencentes às mais ilustres e ricas famílias de Atenas.
Para Sócrates, ninguém adquire a capacidade de conduzir-se, e muito menos os demais, se não tiver autodomínio. Depois dele, a noção de controle pessoal se transformou em um tema central da ética e da filosofia moral. Também se formou aí o conceito de liberdade interior: livre é o homem que não se deixa escravizar por seus apetites e segue os princípios que, com a educação, afloram de seu interior.
Opondo-se ao relativismo de muitos sofistas, para os quais a verdade e a prática da virtude dependiam de circunstâncias, Sócrates valorizava acima de tudo a verdade e as virtudes – fossem elas individuais, como a coragem e a temperança, ou sociais, como a cooperação e a amizade. O pensador afirmava, no entanto, que só o conhecimento (ou seja, o saber, e não simples informações) leva à prática da virtude em si, que é una e indivisível.
Segundo Sócrates, só age erradamente quem desconhece a verdade e, por extensão, o bem. A busca do saber é o caminho para a perfeição humana, dizia, introduzindo na história do pensamento a discussão sobre a finalidade da vida.
O papel do mestre é, então, o de ajudar o educando a caminhar nesse sentido, despertando sua cooperação para que ele consiga por si próprio “iluminar” sua inteligência e sua consciência. Assim, o verdadeiro mestre não é um provedor de conhecimentos, mas alguém que desperta os espíritos. Ele deve, segundo Sócrates, admitir a reciprocidade ao exercer sua função iluminadora, permitindo que os alunos contestem seus argumentos da mesma forma que contesta os argumentos dos alunos. Para o filósofo, só a troca de idéias dá liberdade ao pensamento e à sua expressão – condições imprescindíveis para o aperfeiçoamento do ser humano.
Sócrates comparava sua função com a profissão de sua mãe, parteira – que não dá à luz a criança, apenas auxilia a parturiente. O diálogo socrático tinha dois momentos: o primeiro corresponderia às “dores do parto”, momento em que o filósofo, partindo da premissa de que nada sabia, levava o interlocutor a apresentar suas opiniões. Em seguida, fazia-o perceber as próprias contradições ou ignorância para que procedesse a uma depuração intelectual. Mas só a depuração não levava à verdade – chegar a ela constituía a segunda parte do processo. Aí, ocorria o “parto das idéias”, momento de reconstrução do conceito, em que o próprio interlocutor ia “polindo” as noções até chegar ao conceito verdadeiro por aproximações sucessivas.
O processo de formar o indivíduo para ser cidadão e sábio devia começar pela educação do corpo, que permite controlar o físico. Já para a educação do espírito, Sócrates colocava em segundo plano os estudos científicos, por considerar que se baseavam em princípios mutáveis. Inspirado no aforismo “conhece-te a ti mesmo”, do templo de Delfos, julgava mais importantes os princípios universais, porque seriam eles que conduziriam à investigação das coisas humanas

7. Platão: educação era questão política

Na história das idéias, o grego Platão (427-347 a.C.) foi o primeiro pedagogo, não só por ter concebido um sistema educacional para o seu tempo, mas, principalmente, por tê-lo integrado a uma dimensão ética e política. O objetivo final da educação, para o filósofo, era a formação do homem moral, vivendo em um Estado justo.
Platão foi o segundo da tríade dos grandes filósofos clássicos, sucedendo Sócrates (c. 470-399 a.C.) e precedendo Aristóteles (384-332 a.C.), que foi seu discípulo. Como Sócrates, Platão rejeitava a educação que se praticava na Grécia em sua época e que estava a cargo dos sofistas, incumbidos de transmitir conhecimentos técnicos, sobretudo a oratória, aos jovens da elite para torná-los aptos a ocupar as funções públicas.
Para Platão, "toda virtude é conhecimento". Ao homem virtuoso, segundo ele, é dado conhecer o bem e o belo. A busca da virtude deve prosseguir pela vida inteira — portanto, a educação não pode se restringir aos anos de juventude. Educar é tão importante para uma ordem política baseada na justiça — como Platão preconizava — que deveria ser tarefa de toda a sociedade.
Platão nasceu meses depois da morte de Péricles, o estadista mais identificado com a democracia de Atenas, e morreu dez anos antes da conquista do mundo grego por Felipe da Macedônia. Sua vida coincide em grande parte com a decadência do império ateniense. Platão construiu uma obra voltada para épocas anteriores. Por meio de seus escritos em forma de diálogos que as idéias de Sócrates puderam ser sistematizadas e divulgadas, uma vez que ele não deixou nenhum texto escrito. Nos diálogos, usualmente, Sócrates e um pensador sofista debatem um assunto até uma conclusão. Uma vez que Platão não se coloca como personagem, restou a seus intérpretes póstumos distinguir as idéias de Sócrates das do próprio Platão. A obra platônica foi sistematizada no início da era cristã. Os títulos mais célebres são O Banquete e A República.
Baseado na idéia de que os cidadãos que têm o espírito cultivado fortalecem o Estado e que os melhores entre eles serão os governantes, o filósofo defendia que toda educação era de responsabilidade estatal — um princípio que só se difundiria no Ocidente muitos séculos depois. Igualmente avançada, quase visionária, era a defesa da mesma instrução para meninos e meninas e do acesso universal à educação.
Contudo, Platão era um opositor da democracia — há até estudiosos que o consideram um dos primeiros idealizadores do totalitarismo. O filósofo via no sistema democrático que vigorava na Atenas de seu tempo uma estrutura que dava poder a pessoas despreparadas para governar. Quando Sócrates, que considerava "o mais sábio e o mais justo dos homens", foi condenado à morte sob acusação de corromper a juventude, Platão convenceu-se, de uma vez por todas, de que a democracia precisava ser substituída.
Para ele, o poder deveria ser exercido por uma espécie de aristocracia, mas não constituída pelos mais ricos ou por uma nobreza hereditária. Os governantes tinham de ser definidos pela sabedoria. Os reis deveriam ser filósofos e vice-versa. "Como pode uma sociedade ser salva, ou ser forte, se não tiver à frente seus homens mais sábios?", escreveu Platão.
A educação, segundo a concepção platônica, visava a testar as aptidões dos alunos para que apenas os mais inclinados ao conhecimento recebessem a formação completa para ser governantes. Essa era a finalidade do sistema educacional planejado pelo filósofo, que pregava a renúncia do indivíduo a favor da comunidade. O processo era longo, porque Platão acreditava que o talento e o gênio só se revelam aos poucos.
A formação dos cidadãos começaria antes mesmo do nascimento, pelo planejamento eugênico da procriação. As crianças deveriam ser tiradas dos pais e enviadas para o campo, uma vez que Platão considerava corruptora a influência dos mais velhos. Até os 10 anos, a educação seria predominantemente física e constituída de brincadeiras e esporte. A idéia era criar uma reserva de saúde para toda a vida. Em seguida, começaria a etapa da educação musical (abrangendo música e poesia), para se aprender harmonia e ritmo, saberes que criariam uma propensão à justiça, e para dar forma atrativa a conteúdos de Matemática, História e Ciência. Depois dos 16 anos, à música se somariam os exercícios físicos, para equilibrar força muscular e aprimoramento do espírito.
Aos 20 anos, os jovens seriam submetidos a um teste para saber que carreira deveriam abraçar. Os aprovados receberiam, então, mais dez anos de instrução e treinamento para o corpo, a mente e o caráter. No teste que se seguiria, os reprovados se encaminhariam para a carreira militar e os aprovados para a filosofia — nesse caso, os objetivos dos estudos seriam pensar com clareza e governar com sabedoria. Aos 35 anos, terminaria a preparação dos reis- filósofos. Mas ainda estavam previstos 15 anos de vida em sociedade, testando os conhecimentos entre os homens comuns e trabalhando para se sustentar. Somente os que fossem bem-sucedidos se tornariam governantes ou "guardiães do Estado".
Platão defendia a idéia de que a alma precede o corpo e que, antes de encarnar, tem acesso ao conhecimento. Dessa forma, todo aprendizado não passaria de reminiscência — um dos princípios centrais do pensamento do filósofo.
Com base nessa teoria, que não encontra eco na ciência contemporânea, Platão defendia uma idéia que, paradoxalmente, sustenta grande parte da pedagogia atual: não é possível ou desejável transmitir conhecimentos aos alunos, mas, antes, levá-los a procurar respostas, eles mesmos, a suas inquietações.
Por isso, o filósofo rejeitava métodos de ensino autoritários. Ele acreditava que se deveria deixar os estudantes, sobretudo as crianças, à vontade para que pudessem se desenvolver livremente. Nesse ponto, a pedagogia de Platão se aproxima de sua filosofia, em que a busca da verdade é mais importante do que dogmas incontestáveis. O processo dialético platônico — pelo qual, ao longo do debate de idéias, depuram-se o pensamento e os dilemas morais — também se relaciona com a procura de respostas durante o aprendizado.

8. Aristóteles: o criador da pedagogia da virtude

De todos os grandes pensadores da Grécia antiga, Aristóteles (384-322 a.C.) foi o que mais influenciou a civilização ocidental. Até hoje o modo de pensar e produzir conhecimento deve muito ao filósofo. Foi ele o fundador da ciência que ficaria conhecida como lógica e suas conclusões nessa área não tiveram contestação alguma até o século 17. Sua importância no campo da educação também é grande, mas de modo indireto. Poucos de seus textos específicos sobre o assunto chegaram a nossos dias. A contribuição de Aristóteles para o ensino está principalmente em escritos sobre outros temas.
As principais obras de onde se pode tirar informações pedagógicas são as que tratam de política e ética. "Em ambos os casos o objetivo final era obter a virtude", diz Carlota Boto, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. "Em suas reflexões sobre ética, Aristóteles afirma que o propósito da vida humana é a obtenção do que ele chama de vida boa. Isso significava ao mesmo tempo vida 'do bem' e vida harmoniosa." Ou seja, para Aristóteles, ser feliz e ser útil à comunidade eram dois objetivos sobrepostos, e ambos estavam presentes na atividade pública. O melhor governo, dizia ele, seria "aquele em que cada um melhor encontra o que necessita para ser feliz".
"A educação, para Aristóteles, é um caminho para a vida pública", prossegue Carlota. Cabe à educação a formação do caráter do aluno. Perseguir a virtude significaria, em todas as atitudes, buscar o "justo meio". A prudência e a sensatez se encontrariam no meio- termo, ou medida justa - "o que não é demais nem muito pouco", nas palavras do filósofo.
Um dos fundamentos do pensamento aristotélico é que todas as coisas têm uma finalidade. É isso que, segundo o filósofo, leva todos os seres vivos a se desenvolver de um estado de imperfeição (semente ou embrião) a outro de perfeição (correspondente ao estágio de maturidade e reprodução). Nem todos os seres conseguem ou têm oportunidade de cumprir o ciclo em sua plenitude, porém. Por ter potencialidades múltiplas, o ser humano só será feliz e dará sua melhor contribuição ao mundo se desfrutar das condições necessárias para desenvolver o talento. A organização social e política, em geral, e a educação, em particular, têm a responsabilidade de fornecer essas condições.
A virtude, para Aristóteles, é uma prática e não um dado da natureza de cada um, tampouco o mero conhecimento do que é virtuoso, como para Platão (427-347 a.C.). Para ser praticada constantemente, a virtude precisa se tornar um hábito. Embora não se conheça nenhum estudo de Aristóteles sobre o assunto, é possível concluir que o hábito da virtude deve ser adquirido na escola.
Grande parte da obra que originou o legado aristotélico se desenvolveu em oposição à filosofia de Platão, seu mestre e fundador da Academia ateniense, que Aristóteles freqüentou durante duas décadas. Posteriormente, ele fundaria uma escola própria, o Liceu. Uma das duas grandes inovações do filósofo em relação ao antecessor foi negar a existência de um mundo supra-real, onde residiriam as idéias. Para Aristóteles, ao contrário, o mundo que percebemos é suficiente, e nele a perfeição está ao alcance dos homens. A oposição entre os dois filósofos - ou entre a supremacia das idéias (idealismo) ou das coisas (realismo) - marcaria para sempre o pensamento ocidental.
A segunda inovação de Aristóteles foi no campo da lógica. De acordo com o filósofo, determinar uma verdade comum a todos os componentes de um grupo de coisas é suficiente para conceber um sistema teórico. Para a construção de tal conhecimento, Aristóteles não se satisfez com a dialética de Platão, segundo a qual o caminho para chegar à verdade era a depuração dos argumentos por meio do diálogo.
Aristóteles quis criar um método mais seguro e desenvolveu o sistema que ficou conhecido como silogismo. Ele consiste de três proposições - duas premissas e uma conclusão que decorre das duas anteriores necessariamente, sem que haja outra opção. Exemplo clássico de silogismo é o seguinte. Todos os homens são mortais. Sócrates é um homem. Sócrates é mortal. Isso não basta, porém, para que a lógica se torne ciência. Um silogismo precisa partir de verdades, como as contidas nas duas proposições iniciais. Elas não se sujeitam a um raciocínio que as demonstre. Demonstram-se a si mesmas na realidade e são chamadas de axiomas. A observação empírica - isto é, a experiência do real - ganha, assim, papel central na concepção de ciência de Aristóteles, em contraste com o pensamento de Platão.
Aristóteles não era, como Platão, um crítico da sociedade e da democracia de Atenas.
Ao contrário, considerava a família, como se constituía na época, o núcleo inicial da organização das cidades e a primeira instância da educação das crianças. Atribuía, no entanto, aos governantes e aos legisladores o dever de regular e vigiar o funcionamento das famílias para garantir que as crianças crescessem com saúde e obrigações cívicas. Por isso, o Estado deveria também ser o único responsável pelo ensino. Na escola, o princípio do aprendizado seria a imitação. Segundo ele, os bons hábitos se formavam nas crianças pelo exemplo dos adultos.
Quanto ao conteúdo dos estudos, Aristóteles via com desconfiança o saber "útil", uma vez que cabia aos escravos exercer a maioria dos ofícios, considerados indignos dos homens livres.


9.
A educação no período helenístico
No final do século IV a. C., inicia-se a decadência das cidades-estados gregos assim como a sua autonomia e a força da cultura helênica se funde à das civilizações que a dominam se universaliza e converte-se em helenísticas; nesse período a antiga Paidéia, torna-se enciclopédia ou seja, educação geral" consistindo na ampla gama de conhecimentos exigidos na formação do homem culto diminuindo ainda mais o aspecto físico e estético.
Nesse período eleva-se o papel do pedagogo com a criação do ensino privado e o desenvolvimento da escrita, leitura e o cálculo. O conteúdo abrangente das disciplinas humanistas (gramática, retórica e dialética) e quatro científicas (aritimética, música, geometria e astronomia). Além do aperfeiçoamento do estudo da filosofia e, posteriormente, o de teologia na era cristã.
Inúmeras escolas se espalham e da junção de algumas delas (Academia e Liceu) é formada a Universidade de Atenas, foco importante de fermentação intelectual, que perdura inclusive no período de dominação romana.


10. A educação romana

O florescimento da Civilização Romana não está isento do contágio pelo Helenísmo. De acordo com as palavras de Horácio: “A Grécia conquistada conquistou por sua vez seu selvagem vencedor e trouxe a civilização ao rude Lácio”. Porém, o fosso abissal que separava o "rude Lácio" do elevado nível cultural atingido pelos Gregos foi rapidamente ultrapassado, como consequência da enorme facilidade dos latinos para adaptarem e assimilarem os costumes das outras civilizações, em particular da Civilização Helénica e Helenística.
Constata-se no entanto ter existido alguma resistência à invasão pelo Helenismo. Os pequenos camponeses do Lácio, por exemplo, protegem-se contra as inovações estrangeiras pelo respeito de uma tradição ancestral – o mos maiorum. De acordo com esta tradição, o fim da educação é prático e social. Espera-se que a educação proporcione à criança o saber necessário para o exercício da sua profissão de soldado ou de proprietário rural, que inculque a ética que subordina o indivíduo a um ideal superior – Roma e a Res Publica. O objectivo é formar o cidadão – o civis romanus.
No século II a.c., o pater familias concede à mãe, a matrona romana, os direitos sobre a educação de seus filhos durante a primeira infância, gozando aquela de uma autoridade desconhecida na Civilização Grega. Mas, por volta dos 7 anos de idade, a educação da criança passa a estar a cargo de seu pai ou, na ausência deste, de um tio. Caberá ao pai a responsabilidade de proporcionar ao filho a educação moral e cívica. Esta passa pela aprendizagem mnemónica de prescrições jurídicas concisas e de conceitos, constantes nas Leis das XII Tábuas, símbolo da tradição Romana.
Esta forma de educação tem por base a preocupação natural de associar os valores culturais e o ideal colectivo. Exalta a piedade, no sentido romano do termo pietas que traduz respeito pelos antepassados. Nas tradicionais famílias patrícias, os antepassados representam orgulhosamente os modelos do comportamento, repetidos geração após geração.
Quando o adolescente, por volta dos dezasseis anos de idade, finalmente se liberta da toga praetexta da infância para vestir a toga viril, tem início a aprendizagem da vida pública, o tirocinium fori. O jovem acompanhará o pai ou, se necessário, um outro homem influente, amigo da família e melhor posicionado para o iniciar na sociedade. Durante cerca de um ano, e anteriormente ao cumprimento do serviço militar, o jovem adquire conhecimentos de Direito, de prática pública e da “arte do dizer”, concepção romana da eloquência.


11. Roma adota a Educação Grega

Sabemos que Roma foi incapaz de permanecer imune ao contágio pelo Helenismo. Na constituição do Império Romano, da baía ocidental do Mediterrâneo até ao mar oriental, ficarão integradas diversas cidades Gregas. Mas, muito antes do Império, já os etruscos, haviam sido influenciados pelos Gregos a quem foram buscar o alfabeto, bem como técnicas com vista à aprendizagem da leitura e da escrita.
A influência Helénica não mais cessará de crescer, em particular com a invasão e posterior anexação da Grécia e da Macedónia no século II a.c..
A partir de então, alguns preceptores gregos (se não de nascimento, pelo menos de formação) apoiam a educação familiar dos jovens romanos. Na verdade, afugentados pelas agitações do Oriente ou atraídos pela rica clientela romana, muitos gramáticos, retóricos e filósofos atenienses dirigem-se a Roma. Serão estes os Mestres responsáveis pelo ensino de jovens e de adultos.
Cedo os Políticos de Roma haviam compreendido que o conhecimento da Retórica ateniense seria um fator
decisivo com vista a melhorar a eloquência dos seus discursos junto das multidões. Com a Retórica e a formação literária que lhe servia de base, Roma descortinou a pouco e pouco todos os aspectos encobertos da cultura Grega. Mas o helenismo não é apenas apanágio de alguns. Ele impregna toda a Roma, surgindo também na vida religiosa e nas artes, como seja nos teatros que adoptam os modelos, temas e padrões helenísticos.
Não obstante se reconhecer que os tentáculos da Civilização Helenística se estenderam a todos os domínios, em nenhum é esta influência tão notória como na cultura do espírito, e, por conseguinte, na Educação. A original contribuição da sensibilidade, do carácter, e das tradições de Roma, aparecerá somente sob a forma de retoques de detalhe e pequenas inflexões, favorecendo ou reprimindo alguns aspectos do modelo educativo da Paidéia grega.
Nesse entido, a aristocracia romana recorre, numa primeira fase, a escravos alforriados que a conquista lhes havia proporcionado e, posteriormente, a Mestres de Grego especializados.
Paralelamente a esta preceptoria particular no seio das grandes famílias surge o ensino público do grego, ministrado em verdadeiras escolas, umas vezes por escravos gregos que assumem o papel de Mestres, outras, por Mestres Gregos qualificados. Não satisfeitos com este tipo de educação, muitos jovens romanos deslocar-se-ão à Grécia para aí completarem os seus estudos.
Um indício marcante sublinha o êxito da influência grega na Educação e em particular no desenvolvimento da escola. Roma vai buscar ao Helenismo o termo Paedagougos para designar o escravo incumbido de acompanhar a criança à escola.


12. O Ensino em Roma

No entanto, o ensino em Roma apresenta algumas diferenças significativas face ao modelo educativo dos gregos e algumas novidades importantes na institucionalização de um sistema de ensino.
O ensino da música, do canto e da dança, peças chave da educação grega, tornaram-se objecto de contestação por parte de alguns sectores mais tradicionais, que apelidaram estas formas de arte como impúdicas e malsãs, toleráveis apenas para fins recreativos.
A mesma reacção de oposição surge contra o atletismo, tão essencial à Paideia. Jamais fazendo parte dos costumes latinos, as competições atléticas só penetram em Roma por volta do século II a.c., sob a forma de espectáculos, e sendo a sua prática reservada a profissionais. Os romanos chocam-se com a nudez do atleta e condenam a pederastia, de que o ginásio é o meio natural. Optam assim pelas termas em detrimento do ginásio, que consideram exclusivamente um “jardim de recreio” ou um “parque de cultura”.
O Programa educativo romano privilegia assim uma aprendizagem sobretudo literária, em detrimento da Ciência, da Educação Musical e do Atletismo.
Porém, é aos romanos que se deve o primeiro sistema de ensino de que há conhecimento: um organismo centralizado que coordena uma série de instituições escolares espalhadas por todas as províncias do Império. O carácter oficial das escolas e a sua estrita dependência relativamente ao estado constituem, não apenas uma diferença acentuada relativamente ao modelo de ensino na Grécia, como também uma novidade importante.
É claro que um tal sistema tende a privilegiar uma minoria que, graças aos estudos superiores, ascende àquilo que os romanos consideram ser a vida adulta simultaneamente ativa e digna ou seja, uma elite, com uma elevada formação literária e retórica.
O que não impede que, entre a imensidão de escravos que os romanos abastados do Império possuíam como resultando das suas conquistas, houvesse a preocupação de lhes fornecer, em particular aos mais jovens, os ensinamentos necessários à prática dos seus serviços. Para tal eram reunidos, nas casas de seus amos, em escolas – as paedagogium - ae entregues a um ou mais pedagogos que lhes inculcavam as boas maneiras e, em alguns casos, os iniciavam nas “coisas do espírito”, designadamente na leitura, na escrita e na aritmética. É sabido que as casas dos grandes senhores de Roma dispunham de um ou mais escravos letrados que desempenhavam funções como secretários ou como leitores.
De qualquer forma, na Roma imperial, os Mestres Gregos são protegidos por Augusto, à semelhança do que César havia já feito. Também a criação de bibliotecas, como a do Templo de Apolo, no Palatino, e a do Pórtico de Octávio, é ilustrativa de uma política imperial de cultura.
Esta política, inspirada nas tradições gregas, vai no entanto inflectir algumas práticas anteriores, delineando no estado romano um conjunto de políticas escolares inovadoras. Uma primeira iniciativa é da autoria de Vespasiano, que intervém directamente a favor dos professores, ao reconhecer-lhes uma utilidade social. Com ele se iniciam uma extensa série de retribuições e de imunidades fiscais, atribuídas a gramáticos e retóricos. Segue-se a criação de cátedras de Retórica nas grandes cidades, bem como o favorecimento e promoção da instituição de escolas municipais de gramática e de retórica nas províncias.



13. O nascimento das Escolas Latinas

As primeiras escolas latinas são inteiramente, na sua origem, de inspiração grega. Limitam-se a imitá-las, tanto no que concerne ao programa, como aos métodos de ensino.
Porém, os romanos vão pouco a pouco organizá-las em três graus distintos e sucessivos: a instrução primária, o ensino secundário e o ensino superior, aos quais correspondem três tipos de escolas, confiadas a três tipos de Mestres especializados. As escolas primárias datam provavelmente dos séculos VII e VI a.c., as secundárias surgem no século III a.c. e das superiores somente há conhecimento da sua existência a partir do século I a.c.. A data em que surgiram as primeiras escolas primárias permanece controversa. Pensa-se que o ensino elementar das letras terá surgido em Roma muito antes do século IV a.c., provavelmente remontando ao período etrusco da Roma dos Reis. Data do ano 600 a.c. a tabuleta de marfim de Marsigliana d’Albegna que possui gravada na faixa superior do seu quadro um alfabeto arcaico muito completo, destinado a servir de modelo de escrita incipiente que se exercitava escrevendo na cera da tabuleta.
As escolas secundárias terão surgido por volta do século III a.c.. Este “atraso” relativamente às escolas secundárias gregas não é merecedor de espanto, se reflectirmos sobre a inexistência de uma literatura romana propriamente dita, e sabendo-se à partida que o ensino secundário clássico na Grécia se baseava na explicação das obras de grandes poetas, em particular de Homero. No entanto, é somente no tempo de Augusto (século I a.c.), que o ensino secundário latino assume a sua forma definitiva, rivalizando em valor educativo com o grego, quando Cecílio Epirota, um alforriado de Ático, toma a ousada iniciativa de incluir o estudo de Virgílio e de outros poetas novos nos programas do Ensino Secundário. Um romano culto será doravante aquele que conhecer a obra de Virgílio, da mesma forma que um grego conhece na íntegra e recita os versos de Homero sempre que tenha necessidade de exprimir, ressaltar ou afiançar um sentimento ou uma ideia.
O ensino superior, predominantemente retórico, surge em Roma por volta do século I a.c.. A primeira escola de retórica latina foi aberta no ano de 93 a.c. por L. Plócio Galo, e pouco tempo depois encerrada em virtude da censura levada a cabo por alguns sectores da aristocracia romana que se inquietavam perante o “novo espírito” que a animava e que consideravam contrário ao costume e à tradição dos antepassados.


14. Instrução Primária

Se é certo que a iniciação da criança nos estudos fica a cargo de um preceptor particular (em especial nas famílias aristocráticas), por volta dos sete anos a criança é confiada a um Mestre Primário – o litterator, “aquele que ensina as letras”, também designado por primus magister, magister ludi, magister ludi literarii, ou, como viria a ser designado no século IV a.c., o institutor. O primus magister é, em Roma, mal remunerado e pouco conceituado na hierarquia social.
Tal como na Grécia, também as crianças romanas se faziam acompanhar à escola por um escravo, designado segundo a terminologia grega por Paedagogus. Este poderia, em determinadas circunstâncias, ascender ao papel de explicador ou até mesmo de mentor, arcando assim com a educação moral da criança. O Paedagogus conduzia o seu pequeno senhor à escola, designada por ludus litterarius, e aí permanecia até ao final da lição. O ensino é colectivo, as meninas também frequentavam a escola primária, embora para elas o preceptorado privado pareça ter sido a nota dominante.
Cabe ao Mestre providenciar as instalações. Este resguarda os seus alunos debaixo de um pequeno alpendre protegido por um toldo – pérgula - nas proximidades de um pórtico ou na varanda de alguma mansão aberta e acessível a todos. Há conhecimento de ter existido em Roma uma escola abrigada na esquina do Fórum de César. As aulas são portanto essencialmente ministradas ao ar livre, em local isolado dos barulhos e das curiosidades da rua por meio de um tabique – o velum.
As crianças agrupam-se em torno do Mestre que pontifica da sua cadeira – a cathedra - colocada sobre um estrado. O mestre é muitas vezes assistido por um ajudante, o hypodidascales. Sentadas em escabelos sem encosto, as crianças escrevem sobre os joelhos.
A jornada escolar da criança romana tinha início muito cedo e durava até ao pôr-do-sol. As aulas apenas eram suspensas durante as festas religiosas, nas férias de Verão (dos finais de Julho a meados de Outubro) e também durante as nundinae que semanalmente se repetiam no mercado.
Além da leitura, o programa compreende a escrita em duas línguas (latim e grego) e um pouco de cálculo no qual se inclui a aprendizagem do ábaco e do complexo sistema romano de pesos e medidas. Para a aprendizagem do cálculo recorria-se vulgarmente à utilização de pequenas pedras - calculi - bem como à mímica simbólica dos dedos.
A técnica aprofundada do cálculo escapa no entanto à competência do primus magister, sendo ensinada mais tarde por um especialista, o calculator. Este distingue-se do primus magister na medida em que o seu papel está mais próximo do de um especialista, como os calígrafos ou os estenógrafos.
Na aprendizagem da escrita começava-se por se aprender o alfabeto e o nome das letras, de A a X, antes mesmo de lhes conhecer a forma. O nome das letras era seguidamente ensinado ao contrário, de X a A e posteriormente aos pares, primeiro agrupados segundo uma dada ordem e logo após agrupados de forma aleatória. Seguia-se a aprendizagem das sílabas, em todas as combinações possíveis e, por fim, dos nomes isolados. Estes três tipos de aprendizagem constituem as categorias sucessivas do abecedarii, syllabarii e nomirarri. Antes de passar à redacção de textos era ensaiada a escrita de pequenas frases bem como máximas morais de um ou dois versos.
O ensino da escrita é simultâneo ao da leitura. A criança escreve em sua tabuleta as letras, palavras ou textos cuja leitura deverá posteriormente efectuar. Empregam-se a princípio dois métodos alternados: um que remonta às origens da escola grega e que consiste em guiar a mão da criança para lhe ensinar o ductus, e outro mais moderno, talvez originário da escola latina, em que se utilizam letras gravadas em concavidades na tabuleta que a criança retraça usando o estilete de ferro e seguindo o sulco através da cera. Esta é alisada com o polegar logo que tenha terminado a tarefa, para que assim possa reproduzir as letras na tabuleta.
Quando surgem o pergaminho e o papiro a criança passa a escrever com uma cana talhada e molhada em tinta.
Os livros são feitos com folhas coladas lateralmente e enroladas à volta de uma varinha. Para ler, a varinha é mantida na mão direita e com a outra mão desenrola-se a folha única.
Associada à leitura e à escrita encontra-se a declamação. A criança é incentivada a memorizar pequenos textos à semelhança do que ocorria na Grécia.
Recorre-se frequentemente à emulação e mais ainda à coerção, às reprimendas e aos castigos. O primus magister apoia a sua autoridade na férula, instrumento a que recorre para infringir os castigos nas crianças. “Estender a mão à palmatória”, manum ferulae subducere, é na verdade para os Romanos sinónimo de estudar.
Os alunos são agrupados em classes, de acordo com o seu rendimento escolar. O autor (desconhecido) dos Hermeneumata Pseudodositheana salienta a necessidade de “...levar em conta, para um e para todos, as forças, o adiantamento, as circunstâncias, a idade, os temperamentos vários e o desigual zelo dos diversos alunos.” Esboça-se uma modalidade de “ensino mútuo”, em que os melhores alunos colaboram com o primus magister ensinando aos colegas as letras e as sílabas. O titulos (designação latina para quadro preto) é também uma invenção romana. Consiste num rectângulo de cartão preto em torno do qual os alunos se agrupam de pé, ordeiramente..
Estes métodos começam a ser questionados por volta do século I da nossa era, tendo-se registado desde então uma evolução no sentido de um abrandamento da disciplina em favor de uma indulgência crescente para com as crianças.A rotina pedagógica foi a aligeirada com a introdução de novas práticas de ensino que ficam a dever-se a Marco Fábio Quiontiliano, reconhecido Professor de Eloquência que viveu no século I da nossa era.
Quintiliano foi o primeiro professor pago pelo estado, no Império de Vespasiano, e teve como alunos Plínio o Môço e o próprio Imperador Adriano. Quintiliano alerta para a necessidade de se identificarem os talentos das crianças e chama a atenção para a necessidade de reconhecer as diferenças individuais e de adoptar diferentes formas de procedimento perante elas. Recomendava que se ensinassem simultaneamente os nomes das letras e as suas formas, devendo a eventual imperícia do aluno ser corrigida obrigando-o a reproduzir as letras com o seu estilete na placa dos modelos, previamente gravada pelo professor. É contrário aos castigos físicos, e portanto ao uso da férula. Recomenda a emulação como incentivo para o estudo e sugere que o tempo escolar seja periodicamente interrompido por recreios, já que o descanso é, na sua opinião, favorável à aprendizagem.

15. Ensino Secundário

O ensino secundário é bastante menos difundido que a instrução primária. A maioria das crianças de fraca condição social abandonam a escola no final da Instrução Primária, passando então a frequentar a casa de um Mestre de ensino técnico, por exemplo de Geometria, que os preparará para o exercício de profissões como a carpintaria.
As restantes crianças iniciam por volta dos doze anos de idade um segundo ciclo de estudos, continuando rapazes e raparigas a estudar lado a lado. No caso geral de estudos com a duração de três anos, verifica-se a intervenção do grammaticus, correspondente latino do grammatikus grego, que ensina Gramática e Retórica.
Cecílio Epirota empreende, em finais do século I a.c., o estudo de poetas latinos seus contemporâneos, assim se estabelecendo uma formação nas duas línguas que implicará portanto a participação de dois grammaticus: o grammaticus graecus e o grammaticus latinus. Existiam portanto duas Instituições paralelas: uma para o estudo da língua e da literatura grega, a outra para o estudo da língua e literatura romana. A primeira é uma réplica exacta das escolas gregas, a segunda representava o esforço para salvaguardar as tradições romanas.
À semelhança do que se observava na Grécia, o grammaticus é bastante mais conceituado socialmente que o primus magister. Também ele instala geralmente os alunos numa pérgula ou numa residência existindo em Roma, no século IV da nossa era, cerca de vinte estabelecimentos deste tipo. Requer cerca de seis horas diárias para o ensino da correcção da linguagem, assim como para a explicação dos poetas. Adopta os princípios da metodologia grega, insistindo na ortografia e na pronúncia, multiplicando os exercícios de morfologia e preparando com a escrita de redacções a iniciação à Retórica. O essencial consiste porém no estudo dos clássicos, e sobretudo dos poetas Virgílio, Terêncio e Horácio.
Os alunos aprendem também algumas noções básicas de Geografia, necessárias para a compreensão da Ilíada e da Eneida. Estudam também Astronomia, “...desde que se levanta ou põe uma estrela até à cadência de um verso.”
16. Ensino Superior

O ensino superior, também designado por ensino retórico, tinha início por volta dos quinze anos de idade, altura em que o jovem recebe a toga viril, sinónimo da sua entrada na vida adulta. Estes estudos superiores duravam até cerca dos vinte anos, podendo no entanto prolongar-se por mais tempo. Tinham como finalidade formar Oradores, já que a carreira política representava o ideal supremo.
Roma transformou-se num centro excepcional de estudos para os Mestres de Retórica Gregos. É o caso de Dionísio de Halicarnaso, que viveu em Roma mais de vinte anos (de 30 a 8 a.c.), ali compondo uma monumental História Romana.
No século II surgem os representantes da segunda sofística, os quais cultivam um discurso preciosamente elaborado, bem como a improvisação, perante uma vasta audiência de romanos.
As retóricas latina e grega assemelham-se ainda mais quando o triunfo dos Césares desvia a eloquência latina da vida política e a confina à arte do conferencista ou do advogado. Os retóricos do Ocidente “latinizam” os assuntos que propõem a seus discípulos, ao mesmo tempo que os obrigam a estudar os clássicos romanos, sobretudo Cícero.
Sêneca foi juntamente com Quintiliano, um dos grandes representantes da nova etapa educativa. Esta deixa de
ser assunto particular e adquire um carácter mais técnico que filosófico, passando a aplicar-se de preferência a problemas práticos. Nas suasoriae, o aluno é obrigado a pronunciar-se sobre casos morais; nas controversiae, o futuro orador terá de pleitear um caso em função de textos legais.
Para lá do aperfeiçoamento da eloquência e da retórica, o ensino da Filosofia e da Medicina é essencialmente feito por Mestres Gregos itenerantes, que espalham o seu saber de cidade em cidade.
Com muita frequência, os estudantes latinos vão completar os seus estudos superiores noutras cidades, nomeadamente em Alexandria e sobretudo em Atenas. Sob o império de Vespasiano é estabelecido em Roma um Ateneum semelhante ao Mouseîon de Alexandria, para estudos aprofundados de Retórica. Criam-se cátedras de Retórica que concederam privilégios aos Mestres, dando assim aos romanos a possibilidade de prosseguirem os estudos na própria pátria.
No âmbito do Direito, Roma desempenha um papel inovador oferecendo aos jovens estudantes uma aprendizagem prática pasra além de um ensino sistemático. A complexidade crescente da produção jurídica romana está na origem da fundação de duas escolas superiores de direito em Roma no século II – a de Labeu e a de Cássio.

17. As Escolas Cristãs

Paralelamente às escolas pagãs, a partir dos séculos II e III da nossa era, surgem escolas cristãs, criadas inicialmente com o intuito de formar os futuros homens da Igreja dos conhecimentos necessários à compreensão da mundividência Biblica.
É o caso da escola cristã fundada em Alexandria, escola de ensino superior para a inteligência da fé e das escrituras, onde, entre outras, se estudavam a filosofia, a geometria, a aritmética com a finalidade de melhorar o conhecimento das Escrituras Sagradas.
Com legitimação político-religiosa do cristianiosmo sob o Império de Constantino, os cristãos começam a deprecir a retórica e a cultura pagã e a acusar as escolas que dizem transmitir uma literatura contrária ao espírito cristão, orientadas para valores diferentes dos do evangelho.
Quando cai o Império Romano, só a estrutura religiosa se mantém de pé e, apenas no seu seio, o frágil brilho da ideia de escola vai apesar de tudo encontra alguma continuidade. Desaparecidas as escolas públicas pagãs, caberá agora aos monges, hábeis defensores de todo um património cultural, a tarefa de ensinar e conservar acesa na noite barbárica a chama da cultura clássica.

18. Marco Fábio Quintiliano (40-118)

Nasceu em Calahorra, Espanha, no século I, mas muito cedo se dirigiu para Roma, onde foi discípulo de Palêmon, gramático de Roma que gozou de grande reputação no século I e de Domício Áfer, um orador latino.
Era conhecido como advogado e professor de eloquência, tendo-se tornado o primeiro professor pago pelo estado, no Império de Vespasiano. Ensinou Eloquência durante duas décadas e teve alunos famosos como Plínio o Môço e o próprio Imperador Adriano. Após deixar o ensino, Quintiliano redige o De Institutione Oratoria, verdadeiro tratado de educação intelectual e moral.
De Institutione Oratoria é composto por doze volumes, numerados de I a XII, e propõe-se a formar o orador, através da exposição pormenorizada dos objectivos da educação, dos programas e das metodologias a adoptar. O volume I é consagrado à educação da criança na família e na casa do gramático, onde permanece até cerca dos dezasseis anos de idade, altura em que é guiada até aos cuidados do professor de retórica. O volume II versa justamente sobre os ensinamentos deste último. Os volumes III a VII são dedicados aos géneros demonstrativo, deliberativo, judiciário, narração e argumentação, entre outros. Os volumes VIII a X versam sobre a eloquência, sendo expostos diferentes arranjos de palavras bem como diversos ritmos oratórios. O volume XI trata da importância da memória e da acção e finalmente o volume XII refere quais as condições necessárias a um futuro orador.
Os pressupostos teóricos em que a obra se fundamenta seguem a tradição retórica grega de Isócrates, tal como foi transmitida por Cícero. O objectivo era a formação do homem bom, hábil no uso da palavra. O aluno apto para tal formação deveria possuir a excelência moral inata, sem defeitos de carácter, o qual poderia ser moldado através da disciplina de uma educação completa e profunda.
Quintiliano opõe-se à preceptoria particular e considera que a criança deverá começar a frequentar a escola o mais cedo possível.
De acordo com Quintiliano, o Mestre deverá ser um homem de carácter e de ciência, na medida em que as suas atitudes e conduta influenciarão de forma determinante o desenvolvimento do aluno.
Quintiliano alerta para a necessidade de se identificarem os talentos nas crianças e coloca a problemática das diferenças individuais (no que se refere às capacidades e ao carácter) e das formas de procedimento a adoptar perante elas. "Trazido o menino para o perito na arte de ensinar, este logo perceberá a sua inteligência e o seu carácter." (Vol.I cap.3)
O Mestre deverá como tal mostrar-se atento à natureza individual de cada aluno, respeitando-a e dela fazendo depender o tipo e grau de complexidade das tarefas que lhe são apresentadas. "A variedade de espíritos não é menor que a dos corpos." (Vol.II cap.8) "Logo que tiver feito essas considerações, o Mestre deverá perceber de que modo deverá ser tratado o espírito do aluno." (Vol.I cap.3)
Sugere que os alunos sejam distribuídos por classis (classes) logo a partir da escola primária, animadas por concursos, dado o pendor das crianças para o jogo. "O gosto pelo jogo entre as crianças, não me chocaria, é este um sinal de vivacidade e nem poderia esperar que uma criança triste e sempre abatida mostre espírito activo para o estudo. Há pois para aguçar a inteligência das crianças, alguns jogos que não são inúteis, desde que se rivalizem a propor, alternadamente, pequenos problemas de toda a espécie." (Vol.I cap.3)
Refere ainda a importância do aproveitamento da memória do aluno como peça chave do processo educativo. "Nas crianças, a memória é o principal índice de inteligência, que se revela por duas qualidades: aprender facilmente e guardar com fidelidade." (Vol.I cap.3)
A educação deverá assim contribuir para o desenvolvimento das disposições naturais de cada aluno, sendo a natureza, para Quintiliano, sinónimo de “homem não educado”. "....dirigir a instrução de maneira a ajudar, através dela, o desenvolvimento das disposições naturais e a favorecer, principalmente, a tendência inata dos espíritos." (Vol.II cap.8)
No que concerne à disciplina, Quintiliano mostra-se contrário ao uso abusivo da férula, por considerar que a coerção física é não só degradante como também ineficaz. "...gostaria pouco que as crianças fossem castigadas......Primeiramente porque é baixo e servil e certamente uma injúria........Além do mais porque se alguém tem um sentimento tão liberal que não se corrija com uma repressão, também resistirá ás pancadas como o mais vil dos escravos." (Vol.I cap.3)
Recomenda a emulação e sobretudo o bom exemplo como incentivos para o estudo e sugere que o tempo que lhe é reservado seja periodicamente interrompido por recreios, já que o descanso é, na sua opinião, favorável à aprendizagem. "A todos, entretanto, deve-se dar primeiro um descanso, porque não há ninguém que possa suportar um trabalho contínuo. É por isso que aqueles cujas forças são renovadas e estão bem dispostos têm mais vigor e um espírito mais ardente para aprender..." (Vol.I cap.3)
Outra inovação proposta por Quintiliano é a instrução simultânea de diversos conteúdos. Assim a escola de gramática deveria familiarizar o aluno com toda a literatura, e a escola de retórica, de modo idêntico, deveria conferir-lhe conhecimentos de música, de aritmética, de geometria e de filosofia.
Quintiliano enumera as qualidades de um bom orador da seguinte forma: conhecimento das coisas (adquirido por meio do domínio da literatura), bom vocabulário e habilidade para efectuar uma escolha criteriosa das palavras, conhecimento das emoções humanas e o poder de as despertar, elegância nos modos, conhecimento da história e das leis, boa dicção, e boa memória. Não obstante, Quintiliano sustenta que um bom orador, terá que ser necessariamente um bom homem. "...não é suficiente falar apenas com concisão, subtileza ou veemência... na verdade a eloquência é com a cítara: não será perfeita a não ser que todas as cordas estejam bem afinadas, desde a mais alta até à mais alta." (Vol.II cap.8)

19. Marco Túlio Cícero (106-43)

Cícero foi o melhor representante do ensino humanista, uma espécie de educação de carácter universal, humanística, supernacional. O seu ideal educativo teria um sentido cosmopolita, universal.
De família de ordem equestre, nasceu em Arpino e viveu no período republicano. Estudou em Atenas e Rodes e teve uma carreira política brilhante em que foi questor, edil e cônsul. Neste último cargo, destacou-se por se opor a Catilina que queria derrubar o governo e saquear Roma, e por aconselhar o senado a votar pela morte do conjurado foi apelidado de “Pai da Pátria”. A sua honestidade era reconhecida nesta época em que as províncias eram pilhadas e saqueadas. Foi decapitado em Fórmias.
Como escritor, Cícero é a suprema expressão do génio latino influenciado pelo génio grego. Os seus tratados filosóficos, ao mesmo tempo que monumentos históricos, são modelos de eloquência. Como escritor produziu muito e entre as suas numerosas obras contam-se, entre outras, Pro Quinctio, Pro Sexto Roscio Amerino, Pro Tullio, Verrinas, In Catilinam, In M. Antonium orationum Philippicarum, De Inventione, De Oratore, Partitiones oratoriae, Brutus, Orator, De republica, De Legibus, Paradoxa Stoicorum, Academia, De finibus bonorum et malorum, Tusculanae Disputationes, De natura deorum, De senectude, De amicitia, De officiis.
Nesta última obra, escrita em 44 e endereçada a seu filho Marcus, Cícero traça um programa de estudos e um ideal de vida que gostaria de o ver realizar. O tratado está dividido em três partes. A primeira trata do homem, a segunda do útil e a terceira examina as relações e conflitos entre o honesto e o útil. Cícero exorta o filho a estudar Grego, Latim, Filosofia e Oratória e assinala a sua supremacia no campo da Oratória mostrando que cultivou, como nenhum grego, ao mesmo tempo, a Oratória e a Filosofia. Num capítulo seguinte, propõe os deveres como tema a ser analisado, e enfatiza a sua honestidade, princípio que procurou sempre alcançar nas suas acções. Posteriormente, investiga se todos os deveres são perfeitos, se a honestidade é um facto e se a utilidade não se opõe à honestidade. Finalmente, mostra o homem como ser racional dotado de instinto gregário e sedento de verdade.

20. Lúcio Annaaeus Sêneca (4-65)

Sêneca era natural de Córdoba, Espanha e viveu a maior parte da sua vida em Roma. É representante da cultura dos primeiros anos do império. Foi exilado na Córsega por Cláudio e chamado a Roma em 49 por Agripina, tornando-se então preceptor de Nero, que mais tarde, não podendo resistir às censuras do filósofo, ordenou a sua morte.
Forma com Epíteto e Marco Aurélio um trinómio de filósofos estóicos que viam na serenidade íntima o fim último do homem.
De Sêneca restaram muitos escritos: Dialogorum libri, De providentia, De vita beata, De tranquillitate animi, De breviate vitae, Ad Helvian matrem de consolatione; De beneficiis; Ad Lucilium; Algumas tragédias imitadas de modelos gregos: Hécuba, Medeia, Fedra, Édipo, Agamémnon e outras.
Ad Lucilius (Cartas a Lucilius), obra composta por 124 cartas em 20 livros, é um conjunto de dissertações estóicas sobre a consolação, a cólera, a clemência, a brevidade da vida, a tranquilidade da alma, a felicidade. As cartas contêm preciosas observações morais e ensinamentos delicados que não envelhecerão jamais.
Sêneca formulou máximas que atravessam os séculos:
“Mostra-te surdo às palavras daqueles que te amam muito”.
“O trabalho é o alimento das almas generosas”.
“Uma árvore isolada não provoca admiração num lugar em que a floresta é muito alta”.
“O mal não está nas coisas, está nas almas”.
“Faz descer a filosofia no fundo do teu coração; alicerça a experiência de teu progresso não sobre a coisa dita ou escrita, mas sobre a firmeza da alma e a redução dos desejos”.
Estas cartas foram lidas e meditadas por muitos espíritos nobres da Idade Média e Renascença tais como Abelardo, Erasmo, Montaigne ou Roger Bacon, e entre os segundos.

sábado, 14 de junho de 2008

IMPORTÂNCIA DA HISTÓRIA DAS IDÉIAS PEDAGÓGICAS

1. O homem é feito de tempo

Comecemos pela reflexão acerca da história e da pedagogia, como teorias que têm por objeto a ação humana. A história é a interpretação da ação transformadora do homem no tempo. A pedagogia é a teoria crítica da educação, isto é, da ação do homem quando transmite ou modifica a herança cultural.

De início, podemos admitir que o homem é um ser histórico, já que suas ações e pensamentos mudam no tempo, à medida que enfrenta os problemas não só da vida coletiva, como também da experiência pessoal.

O trabalho – que é a ação transformadora do homem sobre a natureza - modifica também a maneira de pensar, agir e sentir, de modo que nunca permanecemos os mesmos ao fim de uma atividade, qualquer que ela seja. É nesse sentido que dizemos que, pelo trabalho, o homem se autoproduz, ao mesmo tempo que produz sua própria cultura.
Se o homem é o resultado desse devir, do processo pelo qual constrói a cultura e a si próprio, é impossível pensar em uma natureza humana com características universais e eternas. Não há um conceito de “homem universal” que sirva de modelo para os educadores. Melhor seria referirmo-nos a uma condição humana, resultante do conjunto das relações sociais, mutáveis no tempo. Ou seja, não compreendemos o homem fora de sua prática social, porque esta, por sua vez, se encontra mergulhada em um contexto histórico-social concreto.


2. Educação e ideologia

A partir das relações que estabelecem entre si, os homens criam padrões de comportamento, instituições e saberes, cujo aperfeiçoamento é feito pelas gerações sucessivo, o que lhes permite assimilar e modificar os modelos valorizados em uma determinada cultura. É a educação, portanto, que mantém viva a memória de um povo e dá condições para a sua sobrevivência. Por isso dizemos que a educação é uma estância mediadora que torna possível a reciprocidade entre indivíduo e sociedade.
Esse processo, no entanto, não é isento de distorções. De início, nas sociedades tribais a cultura global é transmitida de maneira informal pelos adultos, atingindo todos os indivíduos. Nas sociedades mais complexas, porém, com a passar do tempo, a educação formal assume um caráter intelectualista cada vez mais distanciado da atividade concreta, destinando-se apenas à elite. As demais classes têm preterida a sua formação, considerada desnecessária porque a elas é destinado o trabalho braçal. Portanto a dicotomia trabalho intelectual versus trabalho manual ora exclui os filhos dos trabalhadores manuais, ora cria uma escola dualista, com objetivos diferentes: para a elite, uma escola de formação que pode estender até os graus superiores, enquanto para os trabalhadores restam os rudimentos do ler e escrever e o encaminhamento para a profissionalização.
Mesmo quando as crianças mais pobres tentam estudar, esbarram em dificuldades inúmeras e, geralmente, não prosseguem sua escolarização. Explicações foram dadas para os fenômenos de exclusão, evasão e repetência, mas tendem a tornar-se justificações ideológicas quando escamoteiam os verdadeiros motivos, impedindo dessa forma a solução dos problemas.
Vamos ilustrar com exemplos algumas dessas falsas justificativas da dicotomia. Há quem pense que para a sociedade funcionar é preciso que uns saibam e outros executem, unas mandem e outros obedeçam. Os mais passivos imaginam que nada pode ser feito, porque “desde que o mundo é mundo, existem pobres e ricos”. Outros atribuem o estado de pobreza à incompetência individual, tanto como o fracasso escolar á preguiça, falta de talento ou ignorância do aluno.
A ideologia é, portanto, um fenômeno das sociedades divididas em classes. Por meio dela a classe dominada não percebe a divisão que a inferioriza e, assumindo os valores dominantes, não é capaz de elaborar a consciência própria da classe a que pertence.


3. A educação antes da escola

Ainda hoje existem regiões onde não há escolas. No entanto, a educação não deixa de ocorrer, embora ela aconteça por processos diferentes daqueles utilizados pelo sistema escolar. Neste texto tecemos algumas considerações sobre a educação que não é feita na escola como nós a conhecemos.
A educação existe mesmo onde não há escolas. Nas sociedades chamadas primitivas e de povos considerados “bárbaros”, por exemplo, não existem escolas nem métodos de educação conscientemente reconhecidos como tais. No entanto, existe educação, cujo objetivo é promover “o ajustamento da criança ao seu ambiente físico e social por meio da aquisição da experiência de gerações passadas”.
Entre os povos primitivos a educação possui uma estrutura muito simples, como veremos a seguir.
Uma das formas pelas quais a criança adquire os conhecimentos necessários entre os povos primitivos é a imitação. Nos primeiros anos de vida a imitação é inconsciente. As crianças brincam com pequenas reproduções dos instrumentos utilizados pelos adultos. Com uma tora na água, por exemplo, aprendem a equilibrar-se e a remar. Assim, mais tarde, saberão manejar uma canoa. As meninas, por sua vez, brincam de preparar comida.
Numa segunda etapa a imitação torna-se consciente. As crianças participam das atividades dos adultos e aprendem por imitação. Essa segunda etapa tem início quando se começa a exigir trabalho da criança.
Ela vai aprendendo, pouco a pouco, as diversas ocupações da tribo: construção de utensílios; a pesca e a caça, entre os povos caçadores; guarda do gado, entre os pecuaristas; trabalhos agrícolas, entre os povos sedentários.


4. A educação e as cerimônias de iniciação

Entre todos os povos primitivos encontramos as cerimônias de iniciação, que possuem especial valor educativo. Em algumas tribos elas são breves; em outras duram anos. Geralmente tais cerimônias se verificam desde o início da adolescência até a admissão do jovem à comunidade adulta da tribo.
Qual o significado educativo dessas cerimônias?
Em primeiro lugar elas têm um valor moral: através das mutilações a que deve se submeter, o menino aprende a suportar a dor; e, pela exposição ao tempo e pela falta de alimentação, aprende a tolerar as circunstâncias difíceis e a fome.

As cerimônias de iniciação possuem também um valor social e político. Através da subserviência aos dirigentes, o menino aprende a obediência e a reverência aos mais velhos e aprende, igualmente, a servir aos idosos e a suprir as necessidades da família.
Outro valor das cerimônias de iniciação é o religioso. Esse valor evidencia-se pelo fato de o totem ser o centro do culto nas cerimônias. O totem - geralmente um animal e às vezes um vegetal é considerado o antepassado mítico da tribo, de quem esperam proteção.
No totem centralizam-se os mitos religiosos explicações que os povos primitivos conseguem dar ao modo de agir das forças da natureza.
As cerimônias de iniciação revestem-se também de um valor prático: nessas cerimônias, os jovens a serem iniciados aprendem os métodos de capturar certos animais, as artes de acender o fogo, de preparar os alimentos, e processos similares de valor prático. Para os povos primitivos, porém, o aspecto importante dessas atividades não é o prático, mas o religioso. Todas essas atividades práticas devem processar-se de modo definido e previamente estabelecido. Tais métodos precisos e característicos de ação constituem sua religião. E esta, pois, não se relaciona com fases isoladas da vida, mas com as mais comuns práticas.


5. O animismo, presença constante na educação primitiva.

Todos os povos primitivos possuem uma característica comum: são animistas. O animismo consiste na crença de que todas as coisas possuem uma alma. As pedras, as árvores, os animais, enfim, todas as formas de existência possuem alma ou espírito.
Por causa dessa crença o homem primitivo atribui tudo o que acontece no ambiente à intervenção de espíritos amigáveis ou hostis, se as ocorrências são, respectivamente, positivas ou negativas. Assim, na busca dos meios necessários para a sobrevivência, o homem primitivo procura agir de maneira a não ofender o espírito que habita os objetos de que precisa. Para isso, ele deve seguir certos métodos que são produtos da experiência de gerações passadas. O aprendizado desses métodos, que apaziguarão o mundo dos espíritos, constitui a parte mais importante da sua educação.
As cerimônias de iniciação, como vimos, servem para transmitir aos jovens a explicação do universo e, assim, torná-los capazes de assegurar um satisfatório ajustamento às suas exigências.


6. Os primeiros professores

Embora todos os homens participassem das cerimônias de iniciação, havia determinadas pessoas às quais cabia a direção das mesmas. Essas pessoas eram denominadas, segundo os diferentes casos, feiticeiros, curandeiros, xamãs, esconjuradores ou homens que consultam os espíritos familiares. Constituem os professores mais primitivos.
Inicialmente, esta classe é formada pelos chefes de grupos familiares; mas, como os deveres do pai se tornam múltiplos e este culto dos espíritos amigos se torna mais complexo, constitui-se um sacerdócio especial. Há, então, um esboço de instrução para o povo em geral, dada pelo sacerdócio; e uma instrução mais elaborada e formal dos futuros membros do sacerdócio, ministrada pelos atuais membros da classe.
Estes últimos são os primeiros professores profissionais. Por vários séculos o ensino permanece como um direito especial do clero, e, por muitos séculos mais, a educação é orientada e dirigida unicamente por ele.


7. O pensamento pedagógico Oriental

A prática da educação é muito anterior ao pensamento pedagógico. O pensamento pedagógico surge com a reflexão sobre a prática da educação, como necessidade de sistematizá-la e organizá-la em função de determinados fins e objetivos.
O Oriente afirmou principalmente os valores da tradição, da não-violência, da meditação. Ligou-se sobretudo à religião, entre as quais se destacam: o taoísmo, o confucionismo, o budismo, o hinduísmo e o judaísmo. Esse pensamento não desapareceu inteiramente. Evoluiu, transformou-se, mas guarda ainda grande atualidade e mantém muitos seguidores.
A educação primitiva era essencialmente prática, marcada pelos rituais de iniciação. Além disso, fundamentava-se pela visão animista: acreditava-se que todas as coisas – pedras, árvores, animais – possuíam uma alma semelhante à do homem. Espontânea, natural, não-intencional, a educação baseava-se na imitação e na oralidade, limitada ao presente imediato. Outra característica dessa visão é o totemismo religioso, concepção de mundo que toma qualquer ser – homem, animal, planta ou fenômeno natural – como sobrenatural e criador do grupo. O agrupamento social que adora o mesmo totem recebe o nome de clã.
A transição da sociedade primitiva para os primeiros estágios da civilização caracteriza-se pelos seguintes aspectos:
• substituição da organização genética da sociedade por uma organização política;
• formação de uma linguagem escrita e de uma literatura.
Enquanto a organização genética da sociedade baseia-se na família ou classe, a organização política baseia-se na individualidade. Na organização política da sociedade, a unidade social é o indivíduo e não a família ou classe como na organização genética.
O segundo aspecto - formação de uma linguagem escrita e de uma literatura - indica que a sociedade, além de ter consciência do seu passado, já descobriu os meios para conservá-lo.
Nas primitivas civilizações orientais a necessidade de dominar línguas geralmente muito difíceis fez com que a educação girasse em torno do domínio da linguagem e da literatura.
Para ilustrar essa afirmação vejamos algo sobre a educação chinesa.



8. A educação chinesa

Os caracteres da linguagem chinesa representam idéias e não sons, ou seja, a escrita chinesa é uma escrita ideográfica e não fonética. Isto significa que ela tem praticamente tantos caracteres ou ideogramas quantas são as idéias. Calcula-se que existem mais ou menos 25 mil caracteres, e esse cálculo pode elevar-se a 260 mil se considerarmos que um simples acento dá um sentido diverso a esses caracteres.
Muitos dos 25 mil caracteres, no entanto, são pouco usados. Os nove livros sagrados utilizados como material educativo chinês contém menos de cinco mil caracteres diferentes. Os Quatro Livros e os Cinco Clássicos que constituem os livros sagrados dos chineses tratam das formas externas da conduta. Esses livros, que são obras de Confúcio (551-479 a.C.) e de seus discípulos, formam a base da principal religião dos chineses, o confucionismo.
Para termos uma idéia do conteúdo desses livros, vejamos um texto de Confúcio:

"Os filhos, a serviço dos pais, ao primeiro canto do galo, devem lavar as mãos, enxugar a boca, pentearse, pôr em cima do cabelo o lenço de seda, firmá-lo com o alfinete, amarrar o cabelo com a fita, escovar o que fica ao ar, então colocar o barrete, deixando pendurados os extremos das tranças. Depois, colocar a jaqueta negra de forma quadrada, as joelheiras e o cinturão, fixando nele os seus tabletes (com inscrições ou para usos de escrita). Pendurar os utensílios dos lados esquerdo e direito do cinturão; do esquerdo, o pequenino espanador ou escova para remover o pó, e o lenço, a faca e a pedra de afiar o estilete e o espelho de metal para obter fogo do sol; do direito, o dedal de agulhas para o polegar e a pulseira, o tubo para os instrumentos de escrever, a bainha para a faca, o grande estilete e a broca para obter fogo da madeira. Deverão então colocar suas polainas e ajustar os cordões dos sapatos". (MULLER. Sacred books of the east, v, 37. p. 449. Apud MONROE, P. Op. Cit., p. 14.)


9. O conteúdo da aprendizagem nas escolas chinesas

Nas escolas, os alunos, além de aprenderem a dominar as formas de linguagem, decoram os textos sagrados, estudam os comentários sobre os mesmos e procuram desenvolver um estilo literário semelhante ao dos escritos sagrados.
Por muitos anos a atividade escolar tem como objetivo decorar os caracteres dos livros didáticos. A escrita, também aprendida nas escolas elementares, é uma atividade muito difícil, pois o número de caracteres chineses é muito grande, além de eles serem muito complicados.


10. O método da educação chinesa

O método utilizado na educação chinesa é o da imitação. Nos primeiros anos ele se resume em decorar. "O objetivo do professor é obrigar seus alunos em primeiro lugar a decorar, em segundo a decorar, em terceiro e sempre a decorar."
A escola chinesa é muito ruidosa, pois cada aluno recita o texto em voz alta, até que ele se fixe em sua memória. Quando tiver aprendido a lição, o aluno entrega o livro ao professor e, de costas para o livro, declama o trecho rapidamente e em voz alta, sem nenhum conhecimento do seu significado. Ele tem que repetir os caracteres na mesma ordem em que aparecem no livro e com a maior rapidez possível.


11. Organização da educação chinesa

Em todas as aldeias chinesas existiam as escolas elementares. Elas eram mantidas pelas contribuições dos alunos e com o auxílio voluntário de associações particulares. Praticamente não existiam prédios escolares. A escola funcionava em qualquer sala vaga de casa particular, nos templos, nos edifícios públicos ou, ainda, numa cabana ou em qualquer abrigo coberto de uma esquina ou canto de rua.
Os dias letivos eram longos e se estendiam durante o ano todo. Na China apenas um pequeno número de crianças freqüentava a escola e, dessas apenas um vigésimo ia além do grau elementar.
Os exames constituíam o aspecto central do sistema educacional chinês. Por seu intermédio eram escolhidos todos os funcionários públicos, o que, aliás, era o objetivo primordial dos exames. Os alunos, através dos exames, podiam alcançar os seguintes graus: "talento florido", "homem promovido" e "completo erudito" ou "apto para o cargo".
Os exames consistiam na redação de ensaios em prosa e verso sobre os diversos temas das escrituras sagradas.


12. A educação hindu

Em seus aspectos mais gerais a educação hindu não difere muito da chinesa. A diferença da educação hindu para a chinesa e com outros sistemas orientais deve-se principalmente ao sistema de, castas da sociedade hindu.
Essas castas são quatro:
1. Os brâmanes ou sacerdotes: esta classe fornece todos os professores e controla toda a legislação.
2. Os xátrias, ou seja, os generais ou classe executiva militar.
3. Os vaicias ou classe industrial.
4. Os sudras ou classe servil.
Além dessas castas havia os párias, que eram considerados fora da organização social bramânica, ou sem casta. Os sudras e párias não recebiam nenhum tipo de educação formal. Os membros das classes guerreira e industrial Imitam acesso às escolas mantidas pelos membros da classe superior. A educação literária superior, no entanto, era reservada unicamente aos brâmanes. Eles adquiriam um minucioso conhecimento das escrituras sagradas.


13. A educação judaica

Num aspecto os judeus diferenciaram-se dos demais povos orientais: deram muito mais oportunidade para o desenvolvimento da personalidade. E nesse aspecto, inclusive, contribuíram para o desenvolvimento da cultura ocidental. Nos demais aspectos da educação, no entanto, eles não diferem muito do tipo oriental.
Com relação ao ensino, os judeus não foram tão adiantados quanto os chineses, pois praticamente não chegaram a possuir escolas para o povo em geral. Toda a instrução ministrada pelos escribas e sacerdotes ao povo judeu centralizou-se na lei contida na Bíblia e no Talmude.


Questões para Reflexão

1. Que valores positivos da educação primitiva são ainda válidos atualmente?

2. Que aspectos da primitiva educação oriental podem ser considerados válidos para a educação atual?